Não tenho preconceito de amizade.
Acredito firmemente que “quem encontra um amigo encontra um tesouro”. E em “amigo é coisa pra se guardar do lado esquerdo do peito”.
Sou muito aberta: demonstrou que me aceita, virou amigo.
Não precisa ser do mundo canino, mas tem de ser do mundo dos cachorreiros, dos que gostam de cachorro, e não como aquelas pessoas que olham para os cachorros como se fossem cocôs ambulantes. Ou que só olham com interesse para cães de raça.
Temos de estar abertos para conquistar amigos onde possível. Também deveria estar escrito em todos os lugares, para ninguém esquecer.
Então, tenho amigos caninos e humanos.
Minhas tias são um caso à parte, pois são amigas íntimas. Adoro quando tia Ju se hospeda aqui. Agora, passa pouco tempo, mas, mesmo assim, é puro encantamento.
Ela toma um café da manhã especial – e o mesmo vale para mim. Nem Papai tem coragem de dizer nada para a amiga e eu me refestelo. Pão de forma com manteiga umedecido com leite morno – existe delícia maior? Como pelo menos duas fatias dessas e peço mais, até receber pelo menos um pedacinho mais. Deus sabe quando vou ter nova oportunidade!
Tia Ju faz com todo cuidado, corta em quatro pedaços iguais e me dá na boca… Ai, tomara que ela volte logo.
Tia Ilda me faz carinho e conversa comigo toda vez. Não me deixa de lado.
Há o homem dos biscoitos. Não sei o nome dele, mas há anos Papai e eu o encontramos no passeio e ele me dá uma bolacha de cachorro.
Não gosto de bolacha de cachorro, em casa me recuso a comer algo tão ruim. Mas gosto de ser reconhecida em público como amiga. Então, de longe, ao ver o homem, puxo Papai e não paro de pular até ganhar o meu quinhãozinho.
Tenho alguns jogos, tendo humanos como parceiros.
Com o fisioterapeuta da Mamãe, por exemplo, o jogo é bem divertido. Quando ouço que está chegando, ponho-me a latir. Enquanto ele vem do portão até a porta, pulo e abano o rabo, fazendo pequenos sons. E, quando ele chega perto, saio correndo e vou para o meu canto na sala, rindo, antes que ele consiga me fazer um carinho.
Acho muito divertido.
Jogo também com meus primos, em especial um que mora fora de São Paulo e às vezes passa alguns dias aqui. Adoro entrar no quarto dele, para dormir no tapete, ou encostar o nariz frio na mão dele, que me dá bronca. Saio então feliz e satisfeita, aguardando que ele desça para o café da manhã. Sempre sobra algo para mim.
Aqui perto, na pracinha, fizeram um local cercado, em que os cachorros podem ficar soltos. Gosto de lá porque faço amizades com cães e humanos.
Mas nem sempre é fácil, pois nem todo mundo é amigável.
Papai me deixou no cercado e se sentou num banco, conversando com Mamãe. Eu podia vê-los, por isso estava tranquila.
Além de mim, só estava ali uma mulher com uma cachorrinha daquelas bem delicadas, pequenininhas, de fitinhas e lacinhos, com quem tentei fazer amizade.
Ela, porém, não quis nada comigo e a mulher correu, quando me aproximei, pegou-a e saiu.
No portão, uma outra mulher entrava, como outra cachorrinha no colo.
A que saía disse:
— Cuidado! Hoje apareceu aqui um cachorrão mal-encarado.
A mulher que entrava mudou de ideia e foram as duas embora, deixando-me ali sozinha.
Fiquei com medo que o tal cachorrão aparecesse. Não senti nenhum cheiro diferente, não havia nenhum cachorro à vista, mas, mesmo assim, fiquei com medo.
Mamãe também ouviu o comentário e se levantou, sem nem me dar tempo de dar um dos meus latidos de pedido de socorro.
Assim como eu, ela olhou em volta, preocupada.
— Venha, Cacá, vamos embora. Ouvi que pode aparecer um cachorrão mal-encarado.
Corri para o lado dela, mas, antes de ir embora, percebi que Papai olhava para ela com os olhos arregalados.
Entendi que ele tinha visto o tal cachorro e fiquei bem perto dela.
Ele então prendeu a guia e fomos embora.
Ufa! Escapei por pouco!