Lendo e ouvindo notícias nestes dias, fiquei horrorizada com a elevação dos índices de inflação.
Ri sozinha, lembrando-me de que, na década de 1980, trabalhei em uma ONG feminista.
Em dado momento, recebi, por meio da ONG, uma bolsa de estudos para fazer um curso em uma universidade canadense.
Participavam mulheres de muitos países e pude aprender muitos sobre diferentes culturas e modos de viver, com suas riquezas e dificuldades para as mulheres.
Uma colega africana saía todas as tardes e batia à minha porta, perguntando se eu queria algo do mercado.
Eu sempre queria chocolate e lhe dava dinheiro, sempre um ou dois dólares canadenses a cada dia.
Na volta, ela me entregava o chocolate e o dinheiro, sempre com um ar, como vou dizer, de quem achava algo estranho.
Como eu era muito magra, pensava que ela estranhava eu comer tanto chocolate e manter o peso.
Vai que um dia, cheguei à sala de aula e havia uma discussão: a brasileira, que parecia tão normal e participava com gosto das aulas, tinha algum problema?
Quando entrei, outra colega, paraguaia, estava rindo e explicou a todas que eu dava dinheiro a mais por causa da inflação. No país da Vera, disse ela, as coisas aumentam de preço todos os dias.
E passei parte das minhas noites livres dando palestras para pequenos grupos explicando que era assim, mesmo.
E elas não conseguiam entender como alguém podia parecer normal vivendo em um lugar assim.
Pois é.
Vera Vaccari