NÃO É À TOA QUE DÁ MEDO RELATAR VIOLÊNCIA SEXUAL

Já aconteceu de você ter tanto medo de alguma coisa que só de pensar nela já fica estatelada, como que congelada?
Uma sensação horrível de impotência.
Os gregos antigos contavam um mito, o da Medusa, e é nele que penso agora.
Mulher linda, cabelos maravilhosos…
Um dos deuses, Poseidon, ficou encantado com ela – e simplesmente a estuprou.
Outra deusa, Atená, ficou revoltada, pois a violação havia ocorrido em um templo, lugar considerado por ela sagrado.
E não deixou por menos.
O caso é que Atená fez algo que muitas pessoas fazem ainda hoje: em vez de punir o responsável, puniu a mulher.
E fez isso de um modo horrível, transformando a moça em monstro.
Seus lindos cabelos viraram serpentes e qualquer pessoa que olhasse para ela era transformada em pedra.
Um monte de serpentes venenosas?
Era pra congelar, mesmo.
E é congeladas que ficam muitas vezes meninas, moças e mulheres diante da violência sexual de qualquer tipo.
Pois, assim como Atená fez com a Medusa, muitas vezes é feito também em casos de violência sexual.
Já ouvi dizer
Que uma menina de 10 anos seduziu um homem adulto.
Que outra menina, ainda mais nova, pediu pelo que aconteceu a ela na família.
Que as roupas femininas é que são responsáveis pela falta de controle do homem.
Que…
Que…
Que…
Sempre vai haver alguém – muitas vezes uma mulher — saltando de faca na mão em defesa do homem.
Coitadinho.
Indefeso.
Incapaz de se controlar.
Não admira que as vítimas só descongelem anos depois do acontecido, muitas vezes depois de passarem por psicoterapia.
E aí contam para a família, esperando solidariedade.
Mas muitas vezes acontece o mesmo que com Medusa.
Em vez de apoio, encontra rejeição.
Você só quer prejudicar a família.
Não ouvi barulho.
Você não falou porque não quis.
Se tivesse gritado alguém teria ouvido.
Já nasceu de chifre virado.
(Acrescente o que já ouviu a respeito.)
E a dor emocional, em vez de diminuir, aumenta.
O mínimo que podemos fazer é ouvir.
Dar voz às tantas mulheres de todas as idades que passam por humilhações indescritíveis não por serem criminosas, mas por terem sofrido crimes.

 

 

Imagem: pixels


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