Antes da pandemia, fui a uma festa de noivado da filha de uma família amiga.
À porta, a dona da casa nos recebeu e chamou o marido, que falava com outros convidados. Do outro lado, a ex-mulher do dono da casa nos viu e veio nos abraçar, trazendo o atual pela mão.
O ex-marido da dona da casa, com sua nova esposa, não tardou a aparecer.
O resumo, pra gente não se perder entre ex-qual e atual-qual, é que todos conversavam entre si, recebiam os convidados, aceitavam sem dramas quando alguém confundia quem-era-quem ali.
Um exemplo de que a família, como a conhecemos, está passando por grandes mudanças.
Não que antes a família fosse aquela perfeição, baseada na Sagrada Família, que às vezes querem que acreditemos.
Um dos meus amigos descreve como era visitar os avós em importante cidade no interior de São Paulo, casa no largo da igreja, família com nome em rua e no banco da praça.
Abraçados avô e avó, terminado o lanche ou o almoço, ele, já adolescente, acompanhado do pai e da mãe, ia visitar a “outra” família do avô, cumprimentar a “outra” avó e pedir a bênção dos “outros” tios.
Tudo às claras, diferentemente de outras famílias, que fingiam não saber de “outras” mulheres e “outros” filhos, que enfrentavam todo tipo de preconceito.
Mas ambas as situações decorrem do machismo, ainda muito presente na nossa sociedade.
Isso tudo para dizer que há muita hipocrisia ao se falar de família que, para muitos, é aquela formada pelo casamento, com pai, mãe e filhos.
Será que essa é a família que temos?
Fico abismada ao ler que uma em cada cinco crianças no Brasil não tem o nome do pai na certidão de nascimento.
Isso parece indicar que essas crianças não têm pensão ou apoio paterno, cabendo à mãe sozinha os cuidados de todos os tipos. O empobrecimento dessas famílias é uma realidade.
Junte-se a isso a quantidade de homens que, ao se separar da mulher, separam-se também dos filhos, aos quais às vezes até visitam esporadicamente, mas sem se preocupar com pensão, cuidados, afeto.
Em caso de novo casamento, o fato de o pai ter outros filhos, dos quais não cuida, parece que é esquecido ou até mesmo considerado correto pela nova esposa, como se ele não fosse responsável.
Pior, a culpa é muitas vezes colocada na mulher, que “teve filho porque quis”.
Isso quando sabemos que as informações sobre métodos anticoncepcionais são pouco difundidas. E o aborto punido severamente com a prisão… da mulher.